domingo, 25 de março de 2018

A Igreja Católica é a Igreja de Cristo

A Igreja Católica é a Igreja fundada por Cristo, é a Igreja que professamos no Credo: Una, Santa, Católica e Apostólica.
O Concílio Vaticano II não alterou esta verdade, continua a ser na Igreja Católica que se encontra verdadeiramente a Igreja de Cristo, é na Igreja Católica que encontramos a plenitude da Verdade e dos meios de salvação.
A principal novidade do Concílio Vaticano II é de deixarmos de ver as outras Igrejas ou comunidades cristãs apenas como sendo cismáticas ou hereges mas sim como tendo alguns elementos da Verdade de Cristo.
Isto faz com que não se possa considerar essas Igrejas e comunidades cristãs como uma alternativa ou escolha de onde encontrar a Igreja de Cristo, mas sim de que elas têm alguns elementos que podem ajudar a receberem o Evangelho e avançar para a unidade que se poderá realizar na Igreja Católica.

Vamos ver o que a Igreja na verdade ensina sobre esta doutrina:

Cristo, mediador único, estabelece e continuamente sustenta sobre a terra, como um todo visível, a Sua santa Igreja, comunidade de fé, esperança e amor, por meio da qual difunde em todos a verdade e a graça. Porém, a sociedade organizada hierarquicamente, e o Corpo místico de Cristo, o agrupamento visível e a comunidade espiritual, a Igreja terrestre e a Igreja ornada com os dons celestes não se devem considerar como duas entidades, mas como uma única realidade complexa, formada pelo duplo elemento humano e divino. Apresenta por esta razão uma grande analogia com ó mistério do Verbo encarnado. Pois, assim como a natureza assumida serve ao Verbo divino de instrumento vivo de salvação, a Ele indissoluvelmente unido, de modo semelhante a estrutura social da Igreja serve ao Espírito de Cristo, que a vivifica, para o crescimento do corpo (cfr. Ef. 4,16) (11).

Esta é a única Igreja de Cristo, que no Credo confessamos ser una, santa, católica e apostólica (12); depois da ressurreição, o nosso Salvador entregou-a a Pedro para que a apascentasse (Jo. 21,17), confiando também a ele e aos demais Apóstolos a sua difusão e governo (cfr. Mt. 28,18 ss.), e erigindo-a para sempre em «coluna e fundamento da verdade» (I Tim. 3,5). Esta Igreja, constituída e organizada neste mundo como sociedade, é na Igreja católica, governada pelo sucessor de Pedro e pelos Bispos em união com ele (13), que se encontra, embora, fora da sua comunidade, se encontrem muitos elementos de santificação e de verdade, os quais, por serem dons pertencentes à Igreja de Cristo, impelem para a unidade católica.
Vaticano II, CONSTITUIÇÃO DOGMÁTICA LUMEN GENTIUM SOBRE A IGREJA, 21 de Novembro de 1964



É uma só a Igreja « que o nosso Salvador, depois da sua ressurreição, confiou aos cuidados pastorais de Pedro (cf. Jo. 21, 17), confiando-lhes também, a ele e aos demais Apóstolos, a sua difusão e governo (cf. Mt. 18, 28) e erigindo-a para sempre em « coluna e fundamento da verdade » (cf. 1 Tim. 3, 15)»; e esta Igreja de Cristo, « constituída e organizada neste mundo como sociedade, subsiste na Igreja católica, governada pelo Sucessor de Pedro e pelos Bispos em comunhão com ele ».[3] Esta declaração do II Concílio do Vaticano é ilustrada pelo mesmo Concílio, ao afirmar que « só... mediante a Igreja católica de Cristo, instrumento universal de salvação, é possível chegar de facto à posse plena de todos os meios de salvação »,[4] e que a mesma Igreja católica possui « inteira a verdade revelada por Deus e todos os meios da graça » [5] com que Cristo quis dotar a sua comunidade messiânica. Isso não impede, porém, que ela, enquanto ainda peregrina sobre a terra, « porque compreende pecadores no seu próprio seio, seja simultâneamente santa e sempre necessitada de purificação »; [6] e nem sequer que, « fora da sua estrutura », e mais expressamente nas Igrejas ou comunidades eclesiais não em perfeita comunhão com a mesma Igreja católica, « se encontrem muitos elementos de santificação e de verdade, que, por serem dons pertencentes á Igreja de Cristo, impelem para a unidade católica » [7].

Por tais motivos, « é mister que os católicos reconheçam com alegria e estimem os valores genuinamente cristãos, derivantes de um património comum, que se encontram entre os irmãos de nós separados »; [8] e, num esforço comum de purificação e de renovamento, devem aplicar-se em contribuir para restabelecer a unidade entre todos os cristãos, [9] a fim de que se realize a vontade de Cristo e a divisão entre os cristãos não continue a ser obstáculo à proclamação do Evangelho no mundo.[10] Mas, ao mesmo tempo, os católicos estão obrigados a professar que pertencem, por dom misericordioso de Deus, à Igreja fundada por Jesus Cristo e guiada pelos sucessores de Pedro e dos outros Apóstolos, depositários da tradição apostólica originária, intacta e viva, que é património perene de doutrina e de santidade da mesma Igreja.[11] Os fiéis não podem, por conseguinte, figurar-se a Igreja de Cristo, como a suma — diferenciada e, de algum modo, unitária ao mesmo tempo — das Igrejas e comunidades eclesiais; e também não lhes é lícito supor que a Igreja de Cristo hoje em dia já não exista em parte alguma, e que, portanto, não deva ser considerada senão como um objectivo que todas as Igrejas e comunidades têm o dever de procurar.
SAGRADA CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ DECLARAÇÃO MYSTERIUM ECCLESIAE ACERCA DA DOUTRINA CATÓLICA SOBRE A IGREJA PARA A DEFENDER DE ALGUNS ERROS HODIERNOS, 24 de Junho de 1973


4. O perene anúncio missionário da Igreja é hoje posto em causa por teorias de índole relativista, que pretendem justificar o pluralismo religioso, não apenas de facto, mas também de iure (ou de principio). Daí que se considerem superadas, por exemplo, verdades como o carácter definitivo e completo da revelação de Jesus Cristo, a natureza da fé cristã em relação com a crença nas outras religiões, o carácter inspirado dos livros da Sagrada Escritura, a unidade pessoal entre o Verbo eterno e Jesus de Nazaré, a unidade da economia do Verbo Encarnado e do Espírito Santo, a unicidade e universalidade salvífica do mistério de Jesus Cristo, a mediação salvífica universal da Igreja, a não separação, embora com distinção, do Reino de Deus, Reino de Cristo e Igreja, a subsistência na Igreja Católica da única Igreja de Cristo.
Na raiz destas afirmações encontram-se certos pressupostos, de natureza tanto filosófica como teológica, que dificultam a compreensão e a aceitação da verdade revelada. Podem indicar-se alguns: a convicção de não se poder alcançar nem exprimir a verdade divina, nem mesmo através da revelação cristã; uma atitude relativista perante a verdade, segundo a qual, o que é verdadeiro para alguns não o é para outros; a contraposição radical que se põe entre a mentalidade lógica ocidental e a mentalidade simbólica oriental; o subjectivismo de quem, considerando a razão como única fonte de conhecimento, se sente « incapaz de levantar o olhar para o alto e de ousar atingir a verdade do ser »;8 a dificuldade de ver e aceitar na história a presença de acontecimentos definitivos e escatológicos; o vazio metafísico do evento da encarnação histórica do Logos eterno, reduzido a um simples aparecer de Deus na história; o eclectismo de quem, na investigação teológica, toma ideias provenientes de diferentes contextos filosóficos e religiosos, sem se importar da sua coerência e conexão sistemática, nem da sua compatibilidade com a verdade cristã; a tendência, enfim, a ler e interpretar a Sagrada Escritura à margem da Tradição e do Magistério da Igreja.
Na base destes pressupostos, que se apresentam com matizes diferentes, por vezes como afirmações e outras vezes como hipóteses, elaboram-se propostas teológicas, em que a revelação cristã e o mistério de Jesus Cristo e da Igreja perdem o seu carácter de verdade absoluta e de universalidade salvífica, ou ao menos se projecta sobre elas uma sombra de dúvida e de insegurança. 

16. O Senhor Jesus, único Salvador, não formou uma simples comunidade de discípulos, mas constituiu a Igreja como mistério salvífico: Ele mesmo está na Igreja e a Igreja n'Ele (cf. Jo 15,1ss.; Gal 3,28; Ef 4,15-16; Actos 9,5); por isso, a plenitude do mistério salvífico de Cristo pertence também à Igreja, unida de modo inseparável ao seu Senhor. Jesus Cristo, com efeito, continua a estar presente e a operar a salvação na Igreja e através da Igreja (cf. Col 1,24-27),47 que é o seu Corpo (cf. 1 Cor 12,12-13.27; Col 1,18).48 E, assim como a cabeça e os membros de um corpo vivo, embora não se identifiquem, são inseparáveis, Cristo e a Igreja não podem confundir-se nem mesmo separar-se, constituindo invés um único « Cristo total ».49 Uma tal inseparabilidade é expressa no Novo Testamento também com a analogia da Igreja Esposa de Cristo (cf. 2 Cor 11,2; Ef 5,25-29; Ap 21,2.9).50 

Assim, e em relação com a unicidade e universalidade da mediação salvífica de Jesus Cristo, deve crer-se firmemente como verdade de fé católica a unicidade da Igreja por Ele fundada. Como existe um só Cristo, também existe um só seu Corpo e uma só sua Esposa: « uma só Igreja católica e apostólica ».51 Por outro lado, as promessas do Senhor de nunca abandonar a sua Igreja (cf. Mt 16,18; 28,20) e de guiá-la com o seu Espírito (cf. Jo 16,13) comportam que, segundo a fé católica, a unicidade e unidade, bem como tudo o que concerne a integridade da Igreja, jamais virão a faltar.52 

Os fiéis são obrigados a professar que existe uma continuidade histórica — radicada na sucessão apostólica53 — entre a Igreja fundada por Cristo e a Igreja Católica: « Esta é a única Igreja de Cristo [...] que o nosso Salvador, depois da sua ressurreição, confiou a Pedro para apascentar (cf. Jo 21,17), encarregando-o a Ele e aos demais Apóstolos de a difundirem e de a governarem (cf. Mt 28,18ss.); levantando-a para sempre como coluna e esteio da verdade (cf. 1 Tim 3,15). Esta Igreja, como sociedade constituída e organizada neste mundo, subsiste [subsistit in] na Igreja Católica, governada pelo Sucessor de Pedro e pelos Bispos em comunhão com ele ».54 Com a expressão « subsistit in », o Concílio Vaticano II quis harmonizar duas afirmações doutrinais: por um lado, a de que a Igreja de Cristo, não obstante as divisões dos cristãos, continua a existir plenamente só na Igreja Católica e, por outro, a de que « existem numerosos elementos de santificação e de verdade fora da sua composição »,55 isto é, nas Igrejas e Comunidades eclesiais que ainda não vivem em plena comunhão com a Igreja Católica.56 Acerca destas, porém, deve afirmar-se que « o seu valor deriva da mesma plenitude da graça e da verdade que foi confiada à Igreja Católica ».57 

17. Existe portanto uma única Igreja de Cristo, que subsiste na Igreja Católica, governada pelo Sucessor de Pedro e pelos Bispos em comunhão com ele.58 As Igrejas que, embora não estando em perfeita comunhão com a Igreja Católica, se mantêm unidas a esta por vínculos estreitíssimos, como são a sucessão apostólica e uma válida Eucaristia, são verdadeiras Igrejas particulares.59 Por isso, também nestas Igrejas está presente e actua a Igreja de Cristo, embora lhes falte a plena comunhão com a Igreja católica, enquanto não aceitam a doutrina católica do Primado que, por vontade de Deus, o Bispo de Roma objectivamente tem e exerce sobre toda a Igreja.60 

As Comunidades eclesiais, invés, que não conservaram um válido episcopado e a genuína e íntegra substância do mistério eucarístico,61 não são Igrejas em sentido próprio. Os que, porém, foram baptizados nestas Comunidades estão pelo Baptismo incorporados em Cristo e, portanto, vivem numa certa comunhão, se bem que imperfeita, com a Igreja.62 O Baptismo, efectivamente, tende por si ao completo desenvolvimento da vida em Cristo, através da íntegra profissão de fé, da Eucaristia e da plena comunhão na Igreja.63 

« Os fiéis não podem, por conseguinte, imaginar a Igreja de Cristo como se fosse a soma — diferenciada e, de certo modo, também unitária — das Igrejas e Comunidades eclesiais; nem lhes é permitido pensar que a Igreja de Cristo hoje já não exista em parte alguma, tornando-se, assim, um mero objecto de procura por parte de todas as Igrejas e Comunidades ».64 « Os elementos desta Igreja já realizada existem, reunidos na sua plenitude, na Igreja Católica e, sem essa plenitude, nas demais Comunidades ».65 « Por isso, as próprias Igrejas e Comunidades separadas, embora pensemos que têm faltas, não se pode dizer que não tenham peso no mistério da salvação ou sejam vazias de significado, já que o Espírito Se não recusa a servir-Se delas como de instrumentos de salvação, cujo valor deriva da mesma plenitude da graça e da verdade que foi confiada à Igreja Católica ».66
A falta de unidade entre os cristãos é certamente uma ferida para a Igreja; não no sentido de estar privada da sua unidade, mas « porque a divisão é um obstáculo à plena realização da sua universalidade na história ».67
CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ DECLARAÇÃO "DOMINUS IESUS" SOBRE A UNICIDADE E A UNIVERSALIDADE SALVÍFICA DE JESUS CRISTO E DA IGREJA, 6 de Agosto de 2000

(47) Cf. Conc. Vaticano II, Const. dogm. Lumen gentium, n. 14.
(48) Cf. ibid., n. 7.
(49) Cf. S. Agostinho, Enarrat. in Psalmos, Ps. 90, Sermo 2,1: CCL 39, 1266; S. Gregório Magno, Moralia in Iob, Praefatio, 6, 14: PL 75, 525; S. Tomás de Aquino, Summa Theologiae, III, q. 48, a. 2 ad 1.
(50) Cf. Conc. Vaticano II, Const. dogm. Lumen gentium, n. 6.
(51) Símbolo da fé: Denz., n. 48. Cf. Bonifácio VIII, Bula Unam Sanctam: Denz., n. 870-872; Conc. Vaticano II, Const. dogm. Lumen gentium, n. 8.
(52) Cf. Conc. Vaticano II, Decr. Unitatis redintegratio, n. 4; João Paulo II, Carta Enc. Ut unum sint, n. 11: AAS 87 (1995) 921-982.
(53) Cf. Conc. Vaticano II, Const. dogm. Lumen gentium, n. 20; cf. ainda S. Ireneu, Adversus Haereses, III, 3, 1-3: SC 211, 20-44; S. Cipriano, Epist. 33, 1: CCL 3B, 164-165; S. Agostinho, Contra advers. legis et prophet., 1, 20, 39: CCL 49, 70.
(54) Conc. Vaticano II, Const. dogm. Lumen gentium, n. 8.
(55) Ibid., cf. João Paulo II, Carta Enc. Ut unum sint, n. 13. Conc. Vaticano II, Const. Dogm. Lumen gentium, n. 15 e Decr. Unitatis redintegratio, n. 3.
(56) É, portanto, contrária ao significado autêntico do texto do Concílio a interpretação que leva a deduzir da fórmula subsistit in a tese, segundo a qual, a única Igreja de Cristo poderia também subsistir em Igrejas e Comunidades eclesiais não católicas. « O Concílio, invés, adoptou a palavra “subsistit” precisamente para esclarecer que existe uma só “subsistência” da verdadeira Igreja, ao passo que fora da sua composição visível existem apenas “elementa Ecclesiae”, que — por serem elementos da própria Igreja — tendem e conduzem para a Igreja Católica » [Congr. para a Doutrina da Fé, Notificação sobre o volume “Igreja: carisma e poder” do P. Leonardo Boff: AAS 77 (1985) 756-762].
(57) Conc. Vaticano II, Decr. Unitatis redintegratio, n. 3.
(58) Cf. Congr. Para a Doutrina da Fé, Decl. Mysterium ecclesiae, n. 1: AAS 65 (1973) 396-408.
(59) Cf. Conc. Vaticano II, Decr. Unitatis redintegratio, nn. 14 e 15; Congr. para a Doutrina da Fé, Carta Communionis notio, n. 17: AAS 85 (1993) 838-850.
(60) Cf. Conc. Vaticano I, Const. dogm. Pastor aeternus: Denz., n. 3053-3064; Conc. Vaticano II, Const. dogm. Lumen gentium, n. 22.
(61) Cf. Conc. Vaticano II, Decr. Unitatis redintegratio, n. 22.
(62) Cf. ibid., n. 3.
(63) Cf. ibid., n. 22.
(64) Congr. para a Doutrina da Fé, Decl. Mysterium ecclesiae, n. 1.
(65) João Paulo II, Carta Enc. Ut unum sint, n. 14.
(66) Conc. Vaticano II, Decr. Unitatis redintegratio, n. 3.
(67) Congr. para a Doutrina da Fé, Carta Communionis notio, n. 17. Cf. Conc. Vaticano II, Decr. Unitatis redintegratio, n. 4.


Primeira questão: Terá o Concílio Ecuménico Vaticano II modificado a precedente doutrina sobre a Igreja?
Resposta: O Concílio Ecuménico Vaticano II não quis modificar essa doutrina nem se deve afirmar que a tenha mudado; apenas quis desenvolvê-la, aprofundá-la e expô-la com maior fecundidade.
Foi quanto João XXIII claramente afirmou no início do Concílio[1]. Paulo VI repetiu-o[2] e assim se exprimiu no acto de promulgação da Constituição Lumen gentium: "Não pode haver melhor comentário para esta promulgação do que afirmar que, com ela, a doutrina transmitida não se modifica minimamente. O que Cristo quer, também nós o queremos. O que era, manteve-se. O que a Igreja ensinou durante séculos, também nós o ensinamos. Só que o que antes era perceptível apenas a nível de vida, agora também se exprime claramente a nível de doutrina; o que até agora era objecto de reflexão, de debate e, em parte, até de controvérsia, agora tem uma formulação doutrinal segura"[3]. Também os Bispos repetidamente manifestaram e seguiram essa mesma intenção[4]. 

Segunda questão: Como deve entender-se a afirmação de que a Igreja de Cristo subsiste na Igreja católica?
Resposta: Cristo "constituiu sobre a terra" uma única Igreja e instituiu-a como "grupo visível e comunidade espiritual"[5], que desde a sua origem e no curso da história sempre existe e existirá, e na qual só permaneceram e permanecerão todos os elementos por Ele instituídos[6]. "Esta é a única Igreja de Cristo, que no Símbolo professamos como sendo una, santa, católica e apostólica […]. Esta Igreja, como sociedade constituída e organizada neste mundo, subsiste na Igreja Católica, governada pelo Sucessor de Pedro e pelos Bispos em comunhão com ele"[7].
Na Constituição dogmática Lumen gentium 8, subsistência é esta perene continuidade histórica e a permanência de todos os elementos instituídos por Cristo na Igreja católica[8], na qual concretamente se encontra a Igreja de Cristo sobre esta terra.
Enquanto, segundo a doutrina católica, é correcto afirmar que, nas Igrejas e nas comunidades eclesiais ainda não em plena comunhão com a Igreja católica, a Igreja de Cristo é presente e operante através dos elementos de santificação e de verdade nelas existentes[9], já a palavra "subsiste" só pode ser atribuída exclusivamente à única Igreja católica, uma vez que precisamente se refere à nota da unidade professada nos símbolos da fé (Creio… na Igreja "una"), subsistindo esta Igreja "una" na Igreja católica[10]. 

Terceira questão: Porque se usa a expressão "subsiste na", e não simplesmente a forma verbal "é"?
Resposta: O uso desta expressão, que indica a plena identidade da Igreja de Cristo com a Igreja católica, não altera a doutrina sobre Igreja; encontra, todavia, a sua razão de verdade no facto de exprimir mais claramente como, fora do seu corpo, se encontram "diversos elementos de santificação e de verdade", "que, sendo dons próprios da Igreja de Cristo, impelem para a unidade católica"[11].
"Por isso, as próprias Igrejas e Comunidades separadas, embora pensemos que têm faltas, não se pode dizer que não tenham peso ou sejam vazias de significado no mistério da salvação, já que o Espírito se não recusa a servir-se delas como de instrumentos de salvação, cujo valor deriva da mesma plenitude da graça e da verdade que foi confiada à Igreja católica"[12].
CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ, RESPOSTAS A QUESTÕES RELATIVAS A ALGUNS ASPECTOS DA DOUTRINA SOBRE A IGREJA, 29 de Junho de 2007



A primeira questão é se o Vaticano II modificou a precedente doutrina sobre a Igreja.
A pergunta tem a ver com o significado do “novo vulto” da Igreja que, segundo as citadas palavras de Paulo VI, o Vaticano II ofereceu. 

A resposta, baseada no ensinamento de João XXIII e Paulo VI, é muito explícita: o Vaticano II não entendeu modificar, e de facto não modificou, a precedente doutrina sobre a Igreja; o que fez foi aprofundá-la e expô-la de forma mais orgânica. Nesse sentido devem tomar-se as palavras de Paulo VI na sua alocução de promulgação da Constituição Dogmática conciliar Lumen gentium, onde afirma que a doutrina tradicional não foi minimamente modificada, mas simplesmente “o que antes era perceptível apenas a nível de vida, agora também se exprime claramente a nível de doutrina; o que até agora era objecto de reflexão, de debate e, em parte, até de controvérsia, agora tem uma formulação doutrinal segura”[2]. 

Da mesma maneira, há continuidade entre a doutrina exposta pelo Concílio e a recordada nas sucessivas intervenções do Magistério, que retomaram e aprofundaram a mesma doutrina, contribuindo ao mesmo tempo para o seu progresso. Neste sentido e por exemplo, a Declaração da Congregação para a Doutrina da Fé Dominus Iesus mais não fez que retomar os textos conciliares e os documentos post-conciliares, sem nada lhes acrescentar ou tirar. 

Não obstantes estas claras afirmações, no período post-conciliar a doutrina do Vaticano II foi objecto, e continua a sê-lo, de interpretações desviantes e em descontinuidade com a doutrina católica tradicional sobre a natureza da Igreja: se, por um lado, ela era vista como “mudança coperniciana”, por outro, deu-se uma concentração sobre alguns aspectos considerados quase contrapostos a outros. Na realidade, a clara e profunda intenção do Concílio Vaticano II era de inserir e subordinar o tema da Igreja ao tema de Deus, propondo uma eclesiologia no sentido propriamente teo-lógico, mas o acolhimento do Concílio muitas vezes esqueceu esta característica qualificante em favor de afirmações eclesiológicas isoladas e concentrou-se sobre palavras isoladas de fácil compreensão, favorecendo leituras unilaterais e parciais da própria doutrina conciliar. 

Por quanto diz respeito à eclesiologia da Lumen gentium, mantiveram-se na consciência eclesial algumas palavras-chave: a ideia de povo de Deus, a colegialidade dos Bispos como reavaliação do ministério dos bispos juntamente com o primado do Papa, a reavaliação das Igrejas particulares dentro da Igreja universal, a abertura ecuménica do conceito de Igreja e a abertura às outras religiões; enfim, a questão do estatuto específico da Igreja Católica, que se exprime na fórmula, segundo a qual, a Igreja una, santa, católica e apostólica, de que fala o Credo, subsistit in Ecclesia catholica.
Algumas destas afirmações, especialmente a do estatuto específico da Igreja católica com os seus reflexos no campo ecuménico, constituem as principais temáticas enfrentadas pelo documento nas questões sucessivas. 

A segunda questão é como se deve entender que a Igreja de Cristo subsiste na Igreja católica.
Quando G. Philips escreveu que a expressão “subsistit in” faria “correr rios de tinta”[3], provavelmente não previa que a discussão haveria de continuar por tanto tempo e com tal intensidade, a ponto de levar a Congregação para a Doutrina da Fé a publicar o presente documento. 

Uma tamanha insistência, aliás fundada em textos conciliares e do Magistério successivo citados, reflecte a preocupação de salvaguardar a unidade e unicidade da Igreja, que viriam a faltar, se se admitisse que possam existir mais subsistências da Igreja fundada por Cristo. De facto, como se diz na Declaração Mysterium Ecclesiae, se assim fosse, chegar-se-ia a imaginar “a Igreja de Cristo como a soma – diferenciada e, de algum modo, unitária ao mesmo tempo – das Igrejas e Comunidades eclesiais” ou a “pensar que a Igreja de Cristo hoje já não existe em parte alguma e que, portanto, deva ser só objecto de procura da parte de todas as Igrejas e comunidades”[4]. A única Igreja de Cristo já não existiria como una na história ou existiria apenas de forma ideal, ou seja in fieri, numa futura convergência ou reunificação das diversas Igrejas irmãs, desejada e promovida pelo diálogo. 

Mais explícita ainda é a Notificação da Congregação para a Doutrina da Fé sobre os escritos de Leonardo Boff, segundo o qual, a única Igreja de Cristo “pode também subsistir noutras Igrejas cristãs”. Invés – observa a Notificação –, “o Concílio adoptou a palavra ‘subsistit’, precisamente para esclarecer que existe uma só ‘subsistência’ da verdadeira Igreja, ao passo que, fora da sua composição visível, existem apenas “elementa Ecclesiae”, que – por serem elementos da própria Igreja – tendem e conduzem para Igreja católica”[5]. 

A terceira questão é porque se empregou a expressão “subsistit in” e não o verbo “est”.
Foi precisamente esta mudança de terminologia, na descrição da relação entre a Igreja de Cristo e a Igreja católica, que deu ocasião às mais diversas ilações, sobretudo no campo ecuménico. Na realidade, os Padres conciliares simplesmente entenderam reconhecer a presença, nas Comunidades cristãs não católicas enquanto tais, de elementos eclesiais próprios da Igreja de Cristo. Daí resulta que a identificação da Igreja de Cristo com a Igreja católica não se deve entender come se, fora da Igreja católica, exista um “vazio eclesial”. Ao mesmo tempo, significa que, se se considera o contexto em que se situa a expressão subsistit in, ou seja, a referência à única Igreja de Cristo “neste mundo constituída e organizada como uma sociedade… governada pelo sucessor de Pedro e pelos Bispos em comunhão com ele”, a passagem do est ao subsistit in não assume especial significado teológico de descontinuidade com a doutrina católica precedente. 

Ora, porque a Igreja assim querida por Cristo continua de facto a existir (subsistit in) na Igreja Católica, a continuidade de subsistência comporta uma substancial identidade de essência entre Igreja de Cristo e Igreja católica. O Concílio quis ensinar que a Igreja de Jesus Cristo, como sujeito concreto neste mundo, pode ser encontrada na Igreja católica. Isso só se pode realizar uma vez, pelo que a concepção, segundo a qual o “subsistit” deveria multiplicar-se, não traduz propriamente o que se entendia dizer. Com a palavra “subsistit”, o Concílio queria exprimir a singularidade e a não multiplicabilidade da Igreja de Cristo: a Igreja existe como único sujeito na realidade histórica. 

Portanto, a substituição de “est” com “subsistit in”, contrariamente a tantas interpretações sem fundamento, não significa que a Igreja católica abandone a convicção de ser a única verdadeira Igreja de Cristo, mas simplesmente significa uma sua maior abertura à particular exigência do ecumenismo de reconhecer o carácter e dimensão realmente eclesiais das Comunidades cristãs não em plena comunhão com a Igreja católica, graças aos “plura elementa sanctificationis et veritatis” nelas presentes. Por conseguinte, embora a Igreja seja só uma e “subsista” num único sujeito histórico, também fora deste sujeito visível existem verdadeiras realidades eclesiais.
CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ, COMENTÁRIO ÀS RESPOSTAS A QUESTÕES RELATIVAS A ALGUNS ASPECTOS DA DOUTRINA SOBRE A IGREJA, 29 de Junho de 2007








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